segunda-feira, 14 de abril de 2008

Talvez



Talvez o sonho parta-me
Talvez minha tíbia parta-se
Talvez seja-me clausura
Ou não me seja nada

Talvez seja-me enredo
Uma abertura de espaço
Inelutavelmente tu
Em tua forma impraticável

Talvez seja-me a escola
Apinhado de coisas inúteis
Talvez mais proveitoso
Seja-me o educo do nada

Talvez, inda que me seja,
Dobre-se e não seja
Talvez seja-me o quadro
Tal ruptura inadiável

Talvez seja-me a cobra
O câncer do punhal
Ou seja-me o rubro “talvez”
A esfinge doutra coisa

Não sei se posso e quero
Talvez seja-me absurdo
Ou então me seja talvez
O que se quer que seja

O que nunca será “talvez”
O que ninguém pode
O que não se quer que seja...
Mero desperdício de vida

Talvez um copo vazio
Ou nem isso me seja
– uma culpa, quem sabe?,
Que me venha sentida

Ou ressentimento tombado
No cerne de minha pessoa
Esse sujeito inadiável
Que se ocupa aqui do transe

Talvez mesmo seja-me isso:
Talvez-talvez-talvez...
O certo é que não sei,
Já que não se mede tão fácil.

CRISANTE

Poeminho para uma moça com sonho



Ah... feche seus olhos, vá de mansinho
Para dentro de si.
Por esse caminho de sono,
Arranque de nós o abandono dessa distância
Que se fez sem fim...
Corre, moça, para dentro de si
E acorde em mim neste teu sono bendito,
Que dele a distância padece
E por ele o espaço de nós nasce do beijo
Que o sonho nos trouxe infinito...


CRISANTE

Eu somos grupelhos





Eu me fico, às vezes, a imaginar o quanto de mim suportaria ou/e quanta verdade suportaria,
divagações pertinentes ao bicho homem em que me tornei... Macabeico, não sei quantas quimeras criei ou quantas, no eclodir de minhas várias mortes, queimei. Dela (Macabéa) herdei um ponto vital de desconfiança, não da desconfiança dos que fogem exaustivamente do ridículo, ou a desses que se esquivam incessavelmente de uma tola e fundamental possibilidade, a possibilidade do golpe – que é também a possibilidade do ridículo. De vez que fiz dessa a condição original de minha existência, confesso: preciso do ridículo para me achar no entre.
Essa desconfiança de que falo concerne muito mais a mim enquanto unidade que não se aceita por unidade.
Essa desconfiança é o motor primeiro do meu corpo relacional, a partir dela é que afasto o déspota que me habita a alma, a partir dela é que vejo o outro e parto para o entre. É ela a minha ética, é ela o meu amor... Minha poesia...


CRISANTE

...





Então esperar que não sejas por mim. Esperar que tombes sobre minha cabeça, feita escombro,
à margem das horas todas em que passamo-nos. Tudo agora, para saber que não estás comigo e que o mundo, vez mais, tornou-se triste, e que agora as chances se permitem soltas e outra vez mais estamos tristes...
Nunca haverá caminho a quem ame com as mãos cheias de pesar. Nunca haverá senão escombros. Sou mesmo este poeta inquieto, fustigado por minhas coisas de poeta. Meu corpo de poeta anseia por letras que jamais escrevi, letras que jamais escreverei. Sou mesmo essa coisa simples a quem chamam poeta...
“Então por que se enganas?...” Fui-me travado por essa mulher! Lançado para além de onde a vida escoa seus últimos gestos viventes. Nada resta para mim agora. Nada resta senão as dores deste aborto, de ter que abortar de volta ao seio da terra este amor meu...